Empilho o desaconchego do meu coração em uma estante que fica no canto da sala, aperto o passo em direção à pilha de planos falidos que fiz pelo meu caminho... Foram longos dias de faxina. Ninguém faz ideia do quanto isso me desesperou... Cantarolei as poucas canções que embalaram o meu sono e embalei as minhas confusões mais profundas. Coisas que guardei por tempo demais.
Da minha janela, vejo os vizinhos assistirem curiosos a pilha de dúvidas que pus no lixo. Observam como se esperassem que segredos saltassem de dentro dos sacos, negros como o medo que deixei residir no meu coração por todo esse tempo. Vez ou outra, alguém bate em minha porta e se oferece para carregar as caixas da minha ansiedade, eu agradeço, aperto mãos e mais mãos e ofereço-lhes a desculpa de que "este trabalho pertence a mim, somente"... Sou eu quem tem que limpar essa bagunça sozinha.
Reviro meu guarda roupas, olho entristecida os vestidos que escolhi para as minhas noites mais difíceis, aquelas que descrevi em algum papel avulso que foi deixado pela casa... Também recolhi cada um deles, e me deparei com o absurdo de angústia que carreguei sozinha.
Tirei das minhas paredes as fotografias em preto e branco, tão cinzas como as histórias de amor que escrevi em mim.
Levo meus livros para um canto, leio título por título, dedicatórias vindas de gente que já me deixou. Sinto um formigamento nas cicatrizes que ainda vivem, acordo... Carrego os livros para a biblioteca aqui perto, sinto os olhos de todos em mim, olhos que não enxergam um centímetro além da minha superficie. Olhos que nunca me enxergarão, de fato.